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Internação compulsória

     Está na Lei. Mais especificamente no art. 90 da Lei 10.216/2001 (que dispõe sobre os direitos e a proteção das pessoas portadoras de transtornos mentais) e nos art. 1776 e 1777 da Lei 10.406/2002 (Código Civil).  Mesmo se eu não desejar ser tratado, mesmo se eu quiser morrer lascado com meus vícios, o governo vai poder me conduzir a uma desgraça tão grande ou maior que esta que já me consome.
     Levanto os olhos em direção ao que poderia ser minha redenção, aos olhos da sociedade que decide o que é bom e o que é ruim para mim e para todos. E o que vejo?

     Minha mãe me trouxe compulsoriamente ao mundo, onde fui compulsoriamente obrigado a me fazer parte de uma sociedade que não me permite nem mesmo optar por deixá-la.
     Sou obrigado a estudar, obrigado a conhecer as leis do país, obrigado a trabalhar e a pagar impostos injustos. Obrigam-me a não reclamar e a não reagir, nem contra o governo, nem contra os ladrões sem cargo público.
     Me obrigam a ter uma religião, a viver uma sexualidade escravizante e um amor alienante. Ou sou como todos, ou sou louco. E louco a gente põe de lado, despreza, interna, até compulsoriamente.
     Me internaram sem meu aval no mundo, de onde eu não consigo sair vivo e também não consigo viver dentro. Então, busco uma fuga fácil e barata, sem muito custo imediato, com um retorno incrivelmente prazeroso e aí vocês me aparecem com essa coisa de internação compulsória...
     Que querem agora? Que eu saia do mundo que criei pra fugir desse no qual tentaram me aprisionar a vida toda? E querem que eu vá de boa vontade?
     Pois bem, eu desisto. Eu me entrego, mas com uma condição... Me mostrem o mundo bom, perfeito, agradável, sem perigo para a minha vida e para a minha saúde. Me apresentem o lugar limpo, seguro, organizado, apropriado à vida humana, onde eu não terei motivos, nem vontade de me entorpecer, de fugir.
     Me mostrem o que me fará aceitar seu mundo e ir pra ele sem a necessidade de internação compulsória.

5 comentários:

  1. Me chamo Marcelo P. Araújo, sou Enfermeiro Pós-Graduado e atualmente estudante,em formação em Psicanálise, atuo em saúde mental. O texto ao meu observar é sugestivo de clara necessidade de intervenção multiprofissional, tendo em vista a auto defesa de um dependente ou co-dependente. Discurso defensivo, lógico e querente,mas vê-se uma dificuldade de viver em sociedade que é defendida em prol de uma liberdade alucinada,doentia que prega uma liberdade sem limites e paraisos artificiais. Viver em sociedade traz grandes responsabilidade, inclusive a de gerir a própria vida, espera-se,sem trazer prejuizos pra si e pra terceiros. Vejo na internação compulsória um meio de judar o sujeito a manter-se maior tempo em abstinência e nessa lacuna escuta-lo, apropriar desse segundo momento ver o que dirá do seu antes e seu agora. Vale a pena cuidar e de mãos dadas encontrar um caminho.

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    1. Boa Marcelo. Obrigado por contribuir com sua opinião. Seja sempre bem vindo.

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  2. Amigos, sou Robert William, presidente da ONG DEFESA SOCIAL em Belo Horizonte/ Minas Gerais, Somos a unica entidade que conseguiu o instituo da internação compulsória. num total de 06 ocorrencias contra 150 de voluntarias. A Compulsória, como bem disse o amigo Marcelo, é um start para o tratamento, quando, após a desintoxicação o dependente aceita o tratamento até concluí-lo. Portanto, desafio o Conselho de Psicologia (QUE É CONTRARIO) o Movimento da Luta antimanicominial (QUE É CONTRARIO) a mostrar o contrário (trocadilho)uma vez que em todo o território brasileiro, só a Nossa ONG DEFESA SOCIAL faz este acompanhamento. É lógico que a possibilidade de recaída (que é um ótimo tema para outro forum Dr. Weverton)existe em larga escala, pois. por mais que se trabalhe as habilidades do indivíduo,ele será reintegrado ao mesmo ambiente hostil (favelas, submundo, baixo meretricio, ou seja como chamarem)amizades e convivio social,etc. anteriores. Ainda há ao meu ver (OPINIÃO MUITO PESSOAL) que a familia por mais que participe de um grupo de ajuda mútua - o que é fundamental- não é feito um tratamento específico para os diversos males psicológicos que a acometeram.
    O que pode prejudicar com a fase de reinserção e reintegração.
    A nossa instituição defesnde um tratamento real, com participação em seções para todos os membros da primeira familia. E assim, o ambiente estará propicio para a cura!!!!

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    1. Caro Robert,
      muito me honra sua visita e apreciação do meu texto.
      Acho que acertamos ao levantar o questionamento, mesmo que de forma poética e indireta, sobre o que será feito com as pessoas, a partir do momento em que o Estado , "heroicamente" as tirar das ruas. Fico só um pouco menos preocupado, ao saber que existem organizações como a que o amigo representa. Mas, sabemos que isso não é o suficiente. Minha intenção com o texto foi justamente, incitar à reflexão. Minha dúvida é se existem, além da sua ONG e alguns outros serviços voluntários, locais adequadamente preparados HOJE para acolher e fornecer tratamento a essas pessoas. Tira-los da rua é relativamente fácil. Mas, e depois??? Bem... continuemos em nossa batalha. Obrigado mesmo pela contribuição. Seja sempre bem vindo.

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  3. Dr. Weverton te sugiro convidar ao Cloves Benevides, Wellington Vieira, e Marcos Santos, com certeza irão abrilhantar seu blog

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