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Aberta a temporada de ratos abandonando o barco.

Já está aberta a temporada de “ratos abandonarem o navio”. Mal explodiram as bombásticas (não necessariamente verdadeiras, mas necessariamente bombásticas) notícias de envolvimento de certos políticos com ações claramente inadequadas, os sanguessugas oportunistas de plantão já começaram a se manifestar, tentando livrar seus rabos. E o fazem da mesma forma descarada que fizeram quando deram seu apoio público às referidas figuras.
Exemplo bisonho foi o dos apresentadores Marcio Garcia e Luciano Huk, que não temeram fazer papel de idiotas, um afirmando publicamente que se sentiu enganado e o outro apagando as fotos em companhia do “suspeito”. Ora, os não tão jovens astros bonitões da TV, assim como muitos outros artistas e pseudointelectuais contrários à ascensão da senzala, apoiaram abertamente a candidatura do mineiro à presidência da república em 2014.
Não nos esqueçamos que ambos não são hoje e não eram em 2014, nenhuma criança, que qualquer um possa enganar com lorotas infantis e promessas vãs. É claro que alguma vantagem eles esperavam obter e devem ter obtido, ao apoiar o hoje senador afastado e acusado de corrupção e participação em organização criminosa. O mesmo se pode dizer de todas figuras públicas, ou os simples eleitores que agora possam querer fugir da responsabilidade por sua escolha e cobrar da “justiça” uma ação contra os enganadores do povo.
Nenhum de nós pode alegar ter sido enganado. Apoiamos as ideias e os projetos que nos pareceram mais interessantes para nós. Poucos são os que votam com intenção de construir uma república estável e forte. Os interesses pessoais, via de regra, superam o idealismo, esse sim, tomado por infantilidade e romantismo utópico. Os que votam pelo ideal são chamados de radicais e idiotas, guiados por loucos manipuladores.

Diante da avalanche de acusações contra todos, não parece haver qualquer intenção de se buscar uma solução para a crise ética instaurada e já bem enraizada no país. O que se vê é uma polarização absurda, com acusações mútuas, que possibilita ao bom observador enxergar a realidade: todos procuram desesperadamente fugir da responsabilidade pelo seu ato equivocado de escolha. Todos somos responsáveis, mas nenhum de nós quer assumir o peso de haver contribuído para a desgraça que não se pode mais esconder. O problema é que estamos acostumados a esconder nosso erro fazendo propaganda do erro alheio.
Não adianta mais qualquer esforço no sentido de tentar ofuscar a coisa jogando lama no adversário, ou fazendo “cortina de fumaça”. E é exatamente o que ainda continuam tentando fazer. A velocidade com a qual as informações circulam atualmente, bem como o avanço das tecnologias de coleta de imagens e sons, ou de rastreamento de objetos e dados, não permitem que o criminoso tenha tempo para ocultar a sujeira. Rapidamente a coisa vaza. E quando vaza, é impossível se conter a divulgação e se prever os resultados. Quase sempre é feito uso inadequado, apressado, impensado.
Essas informações estão disponíveis para todos. Isso reforça a ideia de que nenhum de nós é ingênuo ao ponto de poder alegar ter sido enganado. Há que se arranjar outro argumento, se seu desejo for manter sua imagem de bom moço. Melhor seria, doravante, evitar se envolver com as ofertas de almoço grátis. O lucro fácil para uns, certamente gerará prejuízo para outros.

Então fica aí um bom motivo para todos nós pensarmos. Não adianta agir como o fizeram Marcio Garcia, dando uma de idiota enganado, ou Luciano Huk, apagando as fotos com o corrupto. Não dá mais para tentarmos fugir da responsabilidade e nos escondermos.
Não dá mais para usar a tática da apresentação de dossiês contra quem já foi seu parceiro de corrupção, na tentativa de inverter o foco e procurar ocultar as próprias mãos sujas. Pior de tudo: não dá mais para negar o inegável, nem há mais tempo para abandonar o barco sem ser notado. Melhor sair com dignidade.

Dias sem mães


                          Weverton Duarte Araújo

Quando eu era criança o dia das mães era experimentado como um culto a uma divindade de carne e osso. Esperávamos ansiosos o dia dedicado à bajulação, à oferta de singelos presentinhos (canecas de louça, panos de prato, enfeites, ou qualquer outra bobagem que nos custava algum esforço, diante da fraqueza dos nossos recursos, mas nada de absurdo, que não pagássemos com uma semana de pequenos trabalhos).
Era um momento de verdadeiro êxtase, poder chorar de emoção diante das lágrimas da homenageada e tê-la tão por perto, tão vulnerável e humana. Mas, no dia seguinte, a divindade retomava seu lugar e o distanciamento entre mãe e filho reaparecia, para durar mais um bom tempo, pelo bem da função materna, do indivíduo em formação e da sociedade como um todo, que tinha por meio daquela relação a garantia de sua subsistência.

Mas o tempo passa... as singelas homenagens passam. Passam os presentinhos baratos e agora somos quase obrigados a comprar algo de valor para não sermos vistos como mesquinhos, diante do esforço sobrenatural que ela nos dedicou a vida inteira. As homenagens do dia das mães não são mais um prazer, nem um culto, mas uma formalidade enjoada e sem graça.
Nos quinze dias que antecedem a data, minha caixa de entrada de e-mails fica atolada de ofertas ridículas, com apelos não menos ridículos. As lojas insistem em empurrar como “o sonho de toda mãe” os produtos que não foram vendidos em outra ocasião.
Querem nos vender algo, não importa o quê. Tudo combina com sua mãe e você tem que dar algo para ela nesse dia. De preferência algo além de suas posses, que comprometa seu cartão de crédito até o fim do ano.
Não se recitam mais versos, jograis, poemas. Poucos mandam flores. No dia seguinte, a mãe de crianças vai continuar ausente, pois os pequenos vão para a “escolinha” e a divindade vai trabalhar o dia inteiro, por não ter um marido que a sustente ou por que se submeteu aos ditames da sociedade que exige que ela trabalhe para ter como consumir produtos. Mas sua voz, que ensinava, corrigia e direcionava, não é ouvida pelos filhos. Quem lhes fala é a escola, que nada pode dizer.
Mãe como função exercida por uma pessoa, numa relação de cuidado com um ser a quem ela ama incondicionalmente, não se vê mais.
Mãe como formadora de pessoas, como principal educadora do indivíduo, antes mesmo de ele ser submetido a qualquer tipo de educação formal. Aquela que ensina os primeiros conceitos e fornece a base para que uma pessoa estabeleça e desenvolva seu caráter, onde se acha?
Mãe como insubstituível cuidadora de um animal que não sobrevive até completar pelo menos um ano de idade se não tiver em torno de si as atenções diuturnas de uma figura materna.
Mãe como disseminadora do ethos da sociedade em que vive, ao inculcar desde cedo naquele que vai ser um cidadão, os princípios básicos de convivência em grupo.
Mãe como a que conduz e introduz por seu discurso a lei-do-pai, que fornece limites ao pequeno ser humano ainda desconhecedor da necessidade de regras.
Mãe como inspiradora do super-ego, que desafia, critica, cobra, instiga e, acima de tudo, está sempre ali, mesmo quando não puder ser vista fisicamente.

Naquela relação entre mães e filhos de menos de meio século atrás, a mãe não pedia, mandava. E mandava apenas com o olhar, às vezes. O respeito era algo quase palpável. A mãe trazia ainda em seu discurso a ameaça de contar para o pai, esse sim, portador da ação punitiva, inibidora e suficiente forte para induzir o filho a se encaixar no modelo apreciado pela sociedade. 
Não podemos dizer que isso funcionava cem por cento, mas podemos, com certeza, afirmar que a falta disso não está dando muito certo.
Aquelas mães já não são encontradas facilmente hoje em dia. Hoje os filhos não temem a ameaça ou a punição, até por que a figura do pai também se transformou no decorrer dos anos. Não existe mais o perigo das chineladas e surras com “vara de marmelo”, ou cinto de couro. 
O pai perdeu seu poder e a mãe sua ferramenta de contenção da euforia desmedida, típica da infância e da juventude. Os resultados estão aí, para se ver, ou para nem se querer ver. As crianças são criadas soltas por aí, sem regras, sem ensinamento de valores, sem punição pelos pequenos erros. É claro que não vai dar em coisa boa.

A pergunta que fica é: Quem vai ocupar o espaço que ficou vago quando as mães saíram de casa para "competir" com os homens no mercado de trabalho, buscando igualdade de direitos, direito de trabalhar, equiparação salarial, respeito pela diferença, tratamento diferenciado pela condição feminina, etc, etc.?
Não vamos entrar na polêmica de se é certo ou errado a mulher ir à luta e deixar a criação dos filhos para alguém. O fato é que as coisas estão assim e assim não está dando certo. Falta alguém para fazer o que as mães faziam e funcionava melhor do que agora. 
Isso sim, é importante e precisa ser pensado. Se não, dentro de pouco tempo nós nos destruiremos uns aos outros, por não termos recebido educação de base, dentro de casa, enquanto era tempo de aprender.

Neste dia das mães, comemoramos dias sem mães, na essência do termo.