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Temos o governo que merecemos.

Nos últimos tempos, uma angústia enorme tem invadido minha vida - não só a minha, é obvio -  especialmente quando me vejo obrigado a pensar e me posicionar em relação à situação política e administrativa do país onde nasci, onde vivo e pretendo permanecer até meu fim, seja quando for.

O problema, é que esperar pelo fim debaixo de um governo como o que temos atualmente, é mais que um sacrifício. Beira à tortura. Pior de tudo é saber que o sujeito foi eleito regularmente embora haja indícios de manipulação da opinião pública no caso da facada, que não encaixa no modo de pensar baseado na razão.

Não temos um líder, nem parecido ao pior líder que porventura tenhamos lembrança de ter tido um dia. Na verdade, temos um representante do modo de pensar e agir de uma grande parcela do nosso povo. É isso: por mais que doa admitir, somos muito parecidos com ele. Basta você ir ao supermercado e ver como nosso povo usa o estacionamento. Também é possível ver representados dele, mesmo uns que negam veementemente qualquer apoio a suas práticas, abusando do poder de ter um carro potente, cometendo os mais absurdos atos de desrespeito às regras e ao próximo. 

A cada dia vemos se tornar mais comuns, manifestações de racismo, sexismo, homofobia, xenofobia, violência e prepotência. Tais atitudes, antes eram ocultas por um discurso do politicamente correto. Mas já não se preocupam mais. O presidente, eleito por eles e mais um bando de analfabetos funcionais, analfabetos políticos, religiosos radicais, ele mesmo se incumbiu de semear a cultura do desrespeito ao próximo, à mulher, ao negro, ao homossexual, ao pobre, ao nordestino, às autoridades constituídas, e por aí vai...

Assim, nosso povo, que de bom tem pouco, está, de certa forma, bem representado. Na verdade, Jair é apenas mais um brasileiro como a maioria de nós. Não podemos reclamar. Ele merece estar lá e nós merecemos o governo que temos.

Homens velhos, meninos ainda.

Weverton Duarte Araújo


O momento que vivemos é de incertezas, insegurança, bem ao tom do conceito central da obra de Bauman. Vivemos sim, tempos de liquidez dos conceitos. Nenhuma ideia, nenhum posicionamento, nem quando vindos de parte de indivíduos ou grupos reconhecidamente radicais, ou fundamentalistas, podem receber nossa aposta cega. No dia seguinte, é muito fácil depararmos com uma declaração de que "não foi bem isso que eu quis dizer", ou, "minha fala foi tirada de contexto".

Tornou-se comum, aceitável, "normal", as pessoas não precisarem mais se responsabilizar por seus atos, por suas falas. Homens velhos, que antes eram respeitados por sua trajetória, por sua experiência de vida, maturidade e equilíbrio, hoje se tornam motivo de chacota, ao se envolverem em imbróglios que até uma criança mais atenta evitaria.

Os jovens, da mesma forma, e até com certa justificativa, já que se espelham nos seus antecessores (para copiá-los ou fugir de seus exemplos), tem confirmado a previsão possível de ser encontrada nos textos lacanianos, já por volta de 1960, de que o século XXI traria uma geração de perversos, movidos pela falta da falta. Aí está essa geração, herdeira do excesso de direitos e da falta de limites, de pais que se orgulham em dizer "meu filho não vai passar o que eu passei". Liberdade sem responsabilidade. Eis o que nos aflige.

Demandar, todos nós demandamos. Viver é um sem fim de buscar o aval do outro como norteador de nosso desejo. Mas, entregar nossa vida nas mãos desse outro, negar nossa subjetividade em prol do desejo do outro e a ele nos submeter, é, no mínimo, preocupante. E o que mais temos visto nos últimos tempos, é essa negação da subjetividade, em favor de uma receita pronta, que não tem dono. Filhos que não tiveram falta, não sabem lidar com ela. Não percebem que o que não tem dono não é do outro, mas também não me pertence.

Estamos fugindo de repetir um modelo que repudiamos, e assim, caímos na tentação niilista de crer no não ser, para não ser como o que não queremos ser. Mas, o que queremos ser, não sabemos. Desse modo, não estabelecemos vínculos, não criamos ou adotamos conceitos já conhecidos, vivendo como eternos fugitivos da própria sombra, "exilados e sem destino", segundo Maria Ester Jozami, psicanalista e escritora argentina.

Não crescemos para não ter que assumir os papéis destinados aos adultos. E o mundo vai de mal a pior, abarrotado de cegos guiando cegos. Meninos birrentos que insistem em repetir a sina de Peter Pan, do Pequeno Príncipe, de Alice, de Truman... Mal sabem eles, esses nossos meninos, que somente gritar "parole", não faz abrir as portas da prisão.



Poliamor x purofuror

Weverton Duarte Araújo


O que podemos esperar quando um representante do cristianismo (a religião do amor, do perdão e do cuidado) começa a pregar abertamente o ódio, o desrespeito e a mentira?

Falo aqui como parte do povo de Divinópolis-MG, que, já assolado pelas mesmas dores que o resto do Brasil tem sofrido, diante da pior crise sanitária dos últimos tempos, e sob o pior governo federal da nossa história, recebe agora, de onde menos devia esperar, uma saraivada de ódio, desrespeito, desequilíbrio e incentivo à violência, pela mensagem grotesca, de mau gosto, de conteúdo dúbio, retrógrada, tendenciosa, suspeita e desnecessária, produzida pelo popular padre Christian, animador de auditório em pele de vigário, que conta com um grande número de seguidores, admiradores, adoradores, etc.

Não bastasse a desorganização do texto, a falta de respeito com as opiniões divergentes da sua suprema verdade, o sugestionamento, as elucubrações e divagações tomam conta do discurso, que de nenhuma forma, parece ter sido feito em um ambiente no qual as pessoas vão à procura da repetição do discurso cristão. Ou seja, se o sujeito vai a uma igreja cristã, supõe-se que ele esteja buscando ouvir o que Jesus diria como resposta a suas perguntas. E não foi isso o que o suposto representante do discurso cristão fez. Pelo contrário, suas palavras e gestos foram de desrespeito a seres humanos, a instituições, a culturas e à própria Constituição Federal. Nunca li ou ouvi dizer que Jesus tenha cuspido em alguém de quem tenha discordado. 

Mas esse tipo de gente, esse tipo de pensamento e de atitude, tem ganhado espaço nos últimos tempos. Alías, o lugar de onde ele fala, já foi por longo período, utilizado para manipular, para roubar, matar e promover o obscurantismo, como a história, se bem lida, não esconde. Humberto Eco, em “o nome da rosa” nos dá um bom exemplo disso. Também a cena inicial de 1492 – a conquista do paraíso, é um claro recorte do que promoveu a igreja católica por séculos a fio.

Professores, Psicólogos e outros ofendidos pela gratuita e violenta verborragia, já se manifestaram, em reação à descabida e intempestiva acusação feita da forma mais inadequada pelo padre, que inclusive confessa no próprio vídeo, não entender do assunto, o que não o impede de manipular uma informação sem a menor garantia de credibilidade, de modo a infundir em seus ouvintes (toda a Internet, já que o vídeo foi publicado, inclusive por um vereador do município) a certeza de que algo de muito ruim aconteceu e dá pistas (foi em uma escola particular).

Quanto ao tema aterrorizante, que suscitou o chilique do clérigo, o poliamor, não é algo novo e absurdo como propõe o desinformado religioso. Pelo contrário, está acessível a qualquer pessoa (inclusive jovens na idade que ele aconselha aos pais “proteger” do ambiente escolar) nas inúmeras páginas da Internet dedicadas ao assunto. Assim, mais suspeita se torna a “acusação” direcionada a “uma escola particular”. Na verdade, as pessoas que defendem tais práticas, apenas as tornam públicas, já que, como outras “perversões sexuais”, são praticadas “às escondidas”, há tempos e tempos. Todo mundo sabe e todo mundo finge que nunca ouviu falar. É o resultado da hipocrisia negacionista que Sartre ilustra com “o inferno são os outros”.

Mas, nos preocupa sobremodo, o fato de que esse mecanismo de disseminação de ódio e violência, tem se tornado muito comum. Há poucos anos, uma mulher (Fabiane Maria de Jesus, em maio de 2014, Guarujá-SP) foi cruelmente assassinada em via pública, por uma turba enlouquecida, após a divulgação de uma notícia falsa em uma rede social. O que nos incomoda e preocupa então, é o fato de, pessoas ocupando lugar de destaque e com o poder de influenciar grandes massas, agirem de forma tão inconsequente, irresponsável, leviana mesmo.