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Poliamor x purofuror

Weverton Duarte Araújo


O que podemos esperar quando um representante do cristianismo (a religião do amor, do perdão e do cuidado) começa a pregar abertamente o ódio, o desrespeito e a mentira?

Falo aqui como parte do povo de Divinópolis-MG, que, já assolado pelas mesmas dores que o resto do Brasil tem sofrido, diante da pior crise sanitária dos últimos tempos, e sob o pior governo federal da nossa história, recebe agora, de onde menos devia esperar, uma saraivada de ódio, desrespeito, desequilíbrio e incentivo à violência, pela mensagem grotesca, de mau gosto, de conteúdo dúbio, retrógrada, tendenciosa, suspeita e desnecessária, produzida pelo popular padre Christian, animador de auditório em pele de vigário, que conta com um grande número de seguidores, admiradores, adoradores, etc.

Não bastasse a desorganização do texto, a falta de respeito com as opiniões divergentes da sua suprema verdade, o sugestionamento, as elucubrações e divagações tomam conta do discurso, que de nenhuma forma, parece ter sido feito em um ambiente no qual as pessoas vão à procura da repetição do discurso cristão. Ou seja, se o sujeito vai a uma igreja cristã, supõe-se que ele esteja buscando ouvir o que Jesus diria como resposta a suas perguntas. E não foi isso o que o suposto representante do discurso cristão fez. Pelo contrário, suas palavras e gestos foram de desrespeito a seres humanos, a instituições, a culturas e à própria Constituição Federal. Nunca li ou ouvi dizer que Jesus tenha cuspido em alguém de quem tenha discordado. 

Mas esse tipo de gente, esse tipo de pensamento e de atitude, tem ganhado espaço nos últimos tempos. Alías, o lugar de onde ele fala, já foi por longo período, utilizado para manipular, para roubar, matar e promover o obscurantismo, como a história, se bem lida, não esconde. Humberto Eco, em “o nome da rosa” nos dá um bom exemplo disso. Também a cena inicial de 1492 – a conquista do paraíso, é um claro recorte do que promoveu a igreja católica por séculos a fio.

Professores, Psicólogos e outros ofendidos pela gratuita e violenta verborragia, já se manifestaram, em reação à descabida e intempestiva acusação feita da forma mais inadequada pelo padre, que inclusive confessa no próprio vídeo, não entender do assunto, o que não o impede de manipular uma informação sem a menor garantia de credibilidade, de modo a infundir em seus ouvintes (toda a Internet, já que o vídeo foi publicado, inclusive por um vereador do município) a certeza de que algo de muito ruim aconteceu e dá pistas (foi em uma escola particular).

Quanto ao tema aterrorizante, que suscitou o chilique do clérigo, o poliamor, não é algo novo e absurdo como propõe o desinformado religioso. Pelo contrário, está acessível a qualquer pessoa (inclusive jovens na idade que ele aconselha aos pais “proteger” do ambiente escolar) nas inúmeras páginas da Internet dedicadas ao assunto. Assim, mais suspeita se torna a “acusação” direcionada a “uma escola particular”. Na verdade, as pessoas que defendem tais práticas, apenas as tornam públicas, já que, como outras “perversões sexuais”, são praticadas “às escondidas”, há tempos e tempos. Todo mundo sabe e todo mundo finge que nunca ouviu falar. É o resultado da hipocrisia negacionista que Sartre ilustra com “o inferno são os outros”.

Mas, nos preocupa sobremodo, o fato de que esse mecanismo de disseminação de ódio e violência, tem se tornado muito comum. Há poucos anos, uma mulher (Fabiane Maria de Jesus, em maio de 2014, Guarujá-SP) foi cruelmente assassinada em via pública, por uma turba enlouquecida, após a divulgação de uma notícia falsa em uma rede social. O que nos incomoda e preocupa então, é o fato de, pessoas ocupando lugar de destaque e com o poder de influenciar grandes massas, agirem de forma tão inconsequente, irresponsável, leviana mesmo.