Diante da insistência de alguns na defesa de uma intervenção militar no Brasil, face ao caos que se implantou no nosso sistema de governo e administração pública, contribuo com o seguinte:
A vida da caserna pode ser instigante, excitante, moralizante e portadora
de um sem fim de adjetivos nobres. As organizações militares são
capazes de desempenhar tarefas de alta complexidade quase sem erro,
devido à organização, a disciplina e o espírito de equipe que obrigatoriamente une seus componentes.
Há, porém, dois aspectos fundamentais que não podem ser negligenciados na formação de um grupo de militares, sejam estes a voluntariedade e a finalidade. É
necessário que alguém opte, seja qual for a motivação, por se
submeter a um regime militar, para que sua participação seja
eficaz e produtiva para com as finalidades do grupo. Também sabemos que um exército tem a finalidade de impor pela força, não de governar. Governar é função de qualquer outro, menos de um exército.
Este preâmbulo tem a finalidade de evocar o grande equívoco
cometido pelos que entronizaram os militares no Brasil em 31 de março
de 1964. Não desprezemos qualquer ganho obviamente obtido durante
os 20 anos que se sucederam após aquela data. É claro que muitos
pontos positivos poderão ser apontados pelos que hoje defendem,
mesmo sem ter experimentado de per si, o retorno da administração
militar sobre o país.
A titulo de advertência a tais incautos, ainda que bem intencionados
e assim como nós, descontentes com os 30 anos de desordem que se
acumularam após o fim do chamado governo militar, trazido pelo
movimento legítimo e voluntário de grande parte da população, bem
como, com a necessidade de acompanhar a evolução que o resto do
mundo já experimentava, vale lembrar que o mundo continua evoluindo
e a largos passos, em sua eterna oscilação cíclica.
Não se vê atualmente, antes pelo contrário, sociedades se fechando
em regimes anti-democráticos. As poucas exceções se observam na África e no Oriente Médio, onde o que se tem de resultado são as
infindáveis guerras civis, ou o domínio de sangrentas teocracias
militarizadas, ou seja, violência, guerra, fome e miséria. Daí
podemos apreender uma lição simples: Em um tempo de evolução
crescente e acelerada, com inúmeras possibilidades de divulgação
de informações acessíveis a todos, não cabe, definitivamente,
desprezar aqueles aspectos anteriormente citados.
A liberdade de escolha, a submissão voluntária (ainda que movida
por necessidade, ou algum interesse vil), o envolvimento popular, não
podem ser desrespeitados. A democracia é um conceito já bem
assimilado, mesmo que sua prática ainda não tenha sido levada a
termo. Ainda isso não seria motivo par buscar sua substituição por
qualquer regime que a negue.
Assim, há que se pensar se queremos salvar a perna ferida, ou
arranca-la inteira, mesmo antes de tentar uma das diversas outras
possibilidades de tratamento disponíveis. Não alcançamos nossa
incipiente democracia por meio de posicionamento radical ou violento.
Nas urnas temos tentado – mais errando que acertando – e ali, nas urnas, temos que continuar a buscar essa construção.
Por fim, tendo vivido esses 50 anos de equívocos administrativos,
posso deixar minha contribuição para o futuro. O que falta ao Brasil não é mera aparência de rigidez no comando de um poder executivo autocrático, que desrespeita, suborna, ou manipula os demais poderes e a opinião pública. O que nos falta é educação, desde o berço. Observemos o que o governo que se aproxima da ideia da militarização tem feito com o ministério da educação e com outros interesses sociais da nação.
Uma coisa é certa:
Observem nossos presídios. Não se cura falta de ética com falta de
liberdade.