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Terra do improviso programado


Cada lei, cada decreto, cada ato administrativo, cada mudança nos ocupantes dos cargos na administração do Estado, que deveriam nos deixar mais seguros, pelo contrário, deixam evidente a incapacidade, o amadorismo, a verdadeira infantilidade com a qual nossos governantes tratam a coisa pública e os interesses do povo brasileiro.
Às vésperas do início de mais um período eleitoral, os interessados em se candidatar a cargos eletivos precisam cumprir determinados procedimentos, como deixar os cargos de confiança que porventura estejam ocupando. Assim está acontecendo no âmbito do governo de Minas Gerais, onde um ex-Delegado de Polícia que fez carreira como Deputado estadual, tendo até sido diretor do DNIT, vai tapar buraco (e que buraco!!!) na Secretaria de Saúde.
Agora, a despeito de haver técnicos capacitados para o cargo, será ele conduzido ao cargo de Secretário Estadual de Saúde. E por tempo determinado, pois já está previsto que em dois meses deixará o cargo para concorrer à infame suplência no cargo de Senador do atual Governador de Minas. Mas isso também faz parte de uma jogada, pois o futuro Senador só ficará no cargo até 2016, quando concorrerá à prefeitura de Belo Horizonte. Assim sendo, não precisamos de bola de cristal ou búzios para saber o que já está definido para daqui a dois anos: teremos mais um Senador eleito sem um voto sequer. Teremos outros políticos fabricados, estrategicamente calculados, sem o menor compromisso com os anseios da população.
Há quatro anos, quando se publicou que a partir de janeiro de 2014 todos os automóveis fabricados no país deveriam vir equipados com air bags frontais e freios com sistema ABS, sentimos a doce ilusão de que finalmente colocávamos o pé no futuro. Às vésperas do fim de 2013, por força dos lobistas das montadoras de veículos, por pouco o governo não deixou que se adiasse por mais dois anos a implantação da regulamentação. Tudo teve que ser resolvido de última hora. Tudo precisou ser renegociado no último instante. Será?
Quem vê a desordem acontecendo agora, não imagina que já está tudo pensado para dois anos à frente. Isso só não acontece nas políticas de governo, onde as decisões realmente são tomadas no calor dos acontecimentos, como nas chuvas do início do ano, como nas manifestações de junho do ano passado.
É assim no país do tapetão no futebol, das bundas à mostra no carnaval, dos recursos infringentes, do improviso programado. 

Rolezinho. Liberdade sem responsabilidade?


Há alguns meses começaram a acontecer nos shoppings Brasil adentro, verdadeiros arrastões, programados por jovens através da internet e executados de tal forma que espalhou pânico entre os usuários dos centros comerciais e é claro, entre os lojistas que, ou foram roubados e ficaram no prejuízo, ou perderam pela queda do movimento que tais ataques geraram.
Como arrastão é coisa de bandido, de favelado, de preto pobre, os adolescentes da nova classe média, quase todos de pele clara e até razoavelmente bem vestidos, que têm dinheiro pra ter um celular ou um tablet e acessar as redes sociais, se agrupam para promover uma nova modalidade de expressão da sua liberdade. Agora a onda é o rolezinho.
Roubam, danificam patrimônio, espalham pânico e pronto. Está exercido o direito de ir e vir e se expressar. São livres, em detrimento da liberdade alheia, da ordem, da paz e do sossego dos que foram ao shopping apenas para fazer compras ou se divertir mesmo.
Interessante é que esses grupos não se envolvem em causas sociais, nem em ajuda mútua, nada que seja produtivo ou útil. Mas, imediatamente se agrupam e organizam um role em repúdio a um outro que tenha sido reprimido. É a manifestação pelo direito aos direitos. Não pensam em deveres, respeito às leis e às instituições. Mas isso não é novidade.
O que mais incomoda são as manifestações de apoio por parte de autoridades públicas sem o menor preparo e instituições de defesa de direitos que se proliferam como vermes e não perdem a oportunidade de falar uma asneira qualquer nesses momentos em que esses jovens aflitos se aliviam da dor de estarem vivos, sem terem sequer um motivo justo para viver.
E já surgiram muitos desses oportunistas. Autoridades acéfalas, meras ocupantes de cargos, que defendem a liberdade, mas se esquecem de ensinar a responsabilidade.

A história do monopaternismo - Uma lenda como todas as outras


Quando ou como tudo começou ninguém sabe exatamente, pois não havia a escrita nem os meios de armazenamento de dados que temos hoje. A história foi ganhando contornos fantasísticos, conforme o interesse de cada povo que a contava. Não só os vencedores a escreveram.
Reunimos alguns relatos que sobreviveram aos tempos, manchados é claro, pelas muitas interpretações, pelos desvios, pelas cópias adulteradas, enfim, pelo que há de real, ou seja, a intervenção desmedida e o jogo de interesses na construção das verdades do monopaternismo. Outros filhos tinham vários pais e não se incomodavam com isso. Muitos pais e muitas mães, diferentemente dos monopaternistas, que em momento algum se referem a ter uma mãe. Estranho não?
Pois nos concentremos na história dos principais representantes desse modo de pensar.
Eram três irmãos de idades muito diferentes. Judsem com mais de 60, Cristem com pouco mais de 20 e Islem com 14... Séculos. Os três totalmente certos de que eram filhos do mesmo pai, o qual nunca viram, mas pelo que se sabe através das histórias repetidas pelos antigos, sim, só podia se tratar do mesmo, o pai que os três evocavam, mesmo que cada um atribuísse um nome diferente a essa figura fantástica e tão diferente para cada um dos três, embora tão igual a qualquer expectador livre de envolvimento em qualquer das famílias, se é que exista algum.
Para comprovar a veracidade de suas reivindicações hereditárias, cada um dos filhos se vangloriava de possuir um testamento produzido pelo próprio pai e a eles entregue por um antigo morador de sua terra natal. O problema é que cada um dos três testamentos havia sido escrito em épocas e idiomas diferentes e muitas páginas, era facilmente perceptível, haviam sido inseridas posteriormente, talvez em substituição à original, danificada por alguma intempérie ou acidente (não vamos nós, meros contadores da história, querer imaginar que algo de suspeito haja aí).
Não se podia portanto, confiar plenamente no conteúdo dos testamentos, por mais fidedignos que parecessem. Também não se pode duvidar da boa vontade dos defensores de sua integridade. Afinal, documento é documento. Não se deve brincar com essas coisas. Os descendentes de Islem sempre levaram muito a sério este fato, ficando mortalmente ofendidos se alguém desmerecesse ou zombasse de seu documento. Os filhos de Cristem já não se apegavam tanto a esses papeis, Falavam deles com muito respeito, mas na verdade, nunca os leram completamente. Usavam-nos às vezes para se defenderem de seus dois irmãos, que frequentemente os acusavam de não serem herdeiros legítimos, mas, usurpadores disfarçados de vítima, por trás de uma história sem muito sentido.
Judsem, velho e desgastado pelas muitas lutas na vida, também por ter o hábito de se aliar a pessoas poderosas em busca de apoio na incansável briga pela herança do suposto abastado pai, achava-se agora em descrédito e rodeado de inimigos, principalmente uns vizinhos briguentos, que o acusam de haver invadido suas terras, onde já viviam há muito tempo. Islem tem muitos primos entre esses vizinhos, de modo que sua relação com Judsem é bastante conturbada. Seus filhos sempre se desentendem e partem para a agressão mútua, matando-se uns aos outros e enfraquecendo ambas as famílias.
Cristem não entra nesse clima de agressões físicas dos irmãos, mas tem muitos filhos em várias partes. Esses filhos andarilhos adotaram costumes muito diferentes, ao ponto de não se poder mesmo, pelos seus hábitos, dizer que são de uma mesma família. Na verdade são três os filhos de Cristem, que formaram três grandes grupos em torno de si. Catolex é o mais velho. Tem muitos filhos e filhas e é muito rico. Enriqueceu-se às custas do ouro doado pelos criminosos em troca do direito a um lugar na cidade que está sendo construída para abrigar criminosos arrependidos e que tenham algum ouro para pagar a passagem. Infelizmente não é dado ao diálogo e monopolizou por muito tempo o conhecimento da verdade, chegando a matar quem ousasse discutir assuntos dessa natureza.
Isso abriu espaço para o segundo irmão, Protevan, que aproveitou a caduquice do irmão mais velho e se estabeleceu como representante e portador da palavra do pai. Sua família também cresceu assombrosamente e de forma pouco cautelosa, já que foram eliminados todos os entraves que antes havia para a entrada na família. Então, gente de toda espécie começou a se agregar ao povo de Protevan, de modo que em pouco tempo já não guardavam qualquer semelhança com seus predecessores. Assim como os Catolex do passado, começaram a construir várias cidades para abrigar criminosos e ultimamente estão investindo em planos de saúde para manter em constante tratamento as vítimas de dores em geral, mas principalmente as que não conseguem abrir os olhos.
Muitos deles costumam dizer que só eles e mais ninguém no mundo são os legítimos herdeiros do legado de Cristem, hostilizando frequentemente o irmão mais velho e humilhando com apelidos os filhos do irmão menor, Espirek.
Esses últimos, pura bondade, jamais fazem ou se metem em escândalos, como os complicados filhos de Catolex e Protevan. Pelo contrário, são discretos, embora ultimamente, suas ideias difíceis de entender, estejam sendo bastante divulgadas, já que eles são bons em escrever livros e até filme já fizeram. Vale lembrar que há entre eles uns descendentes da outra banda do mundo, misturados com uns índios e vaqueiros, originários de nossas terras do sul, formando uma casta com princípios comuns aos Espirek, mas que falam um dialeto diferente, muito engraçado, por sinal. Esses gostam de música e dança. São na maioria humildes e desprendidos. Seus costumes são passados de pai para filho e pouco há escrito sobre eles.
Os filhos de Catolex fizeram muitas cópias do testamento de Cristem, mas, com o passar do tempo e com a preguiça do povo, poucos liam os papeis. Antes, inventaram muitas histórias baseadas nas partes mais importantes do testamento, para inculcar nos seus jovens não mais que a essência da bela história de Cristem. De resto era só lendas e superstições.
Os descendentes de Protevan foram mais ousados. Arrancaram muitas páginas do velho manuscrito de seu ancestral Cristem, deixando apenas as partes que lhes interessavam e passaram a espalhar a falsa notícia de que os filhos de Catolex haviam acrescentado páginas ao texto original. Para complicar mais ainda a situação, os filhos de Espirek, bons de escrita, buscaram inspiração e produziram uma terceira versão para o já sem crédito testamento de Cristem.
Veio gente de todos os lados palpitar sobre qual seria a boa e perfeita vontade do verdadeiro autor do verdadeiro testamento. Um tal Smooth, lá das terras do norte, alega ter desenterrado umas placas de ouro contendo o outro testamento de Cristem, bastante diferente dos anteriores. Muita gente anda lendo o que o Sr. Smooth alega ter descoberto, mas é apenas mais uma variação que não muda em essência o que poderia realmente ser o legado de Cristem. Esses são conhecidos como os Nomroms, por que um anjo de nome parecido teria guiado Smooth a encontrar as tais placas.

Em resumo e para encerrar este primeiro capítulo dessa história fantástica, concluímos acrescentando que, mesmo diante de tamanha divergência entre as tantas alegações dos querelantes pela legitimidade de seus testamentos, acreditamos que os jurados e juízes, mesmo cegos e surdos que são, serão capazes de encontrar em seus corações a justa e perfeita sentença.

continua...