O homem das curvas e dos desafios arquitetônicos, dos vãos
escandalosos e das sustentações improváveis.
Mas, o que perdemos com sua ida? Na verdade, muito mais que um
arquiteto ousado e uma daquelas pessoas que se antecipou à maioria
dos normais de seu tempo. Niemeyer era um comunista convicto, embora
tenha vivido seus cento e cinco anos em uma sociedade que nunca lhe
deu qualquer esperança de ver sua utopia tornada real. Nem que ele
vivesse mais cem anos.
Então, qual o grande exemplo que este brasileiro de sobrenome
alemão, fortemente influenciado pelos ideais libertários marxistas,
em alta nos idos de sua juventude?
Isso mesmo. O que mais ele pode ter deixado de exemplo, além de suas
realizações artísticas, as quais lhe renderam títulos e honrarias
além da média, senão sua capacidade de conviver com a adversidade
reinante entre sua forma de enxergar o mundo e sua oportunidade de
viver no mundo?
Se o tomarmos por exemplo, certamente nos veremos obrigados a pelo
menos três atitudes de grande impacto:
1- Viver 105 anos coincide com ser resiliente o suficiente para
suportar tantas mudanças quanto todo esse tempo trouxer;
2- Viver em um tempo de regras sociais e econômicas opostas àquilo
que se considera adequado, obriga o sujeito a viver uma vida dupla,
sonhando com a liberdade coletiva e construindo a própria prisão;
3- Viver e não se entregar à morte, às ditaduras, aos vícios e
aos impulsos dos próprios desejos, é viver mais para o outro e
menos para si mesmo.
Não vivi cada dia ao lado desse ilustre mais que centenário, mas,
sua insistência em parecer firme, em querer ser visto trabalhando
até quando suportou, certamente não é o que observamos na maioria
do nosso povo. Aliás, trabalhar é o que menos nosso povo quer.
De qualquer modo, não existiriam medalhas e condecorações,
memoriais e homenagens suficientes, para que todos fossemos como ele.
Que seu exemplo possa ao menos inspirar alguns dos nosso jovens, para
que não morra a semente desse tipo de ser humano, idealista e
realista.
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